sexta-feira, 14 de novembro de 2025

  


MOISÉS MENDES é jornalista e este texto foi repostado de seu Blog.
Guilherme Derrite e Hugo Motta em entrevista coletiva (Foto: Marina Ramos/Câmara dos Deputados)
      A Polícia Federal vai pegá-los

“Bolsonaristas tiram proveito da confusão para fingir que estão caçando bandidos, mas a PF vai transformá-los em caça”, escreve Moisés Mendes

Qualquer estagiário do PCC em qualquer fintech da Faria Lima sabe o que Guilherme Derrite foi fazer em Brasília, chamado às pressas por Hugo Motta, pelo centrão e pela extrema direita. 
Mas os moradores de Lajeado, no Vale do Taquari, no Rio Grande do Sul, podem não saber direito, porque estão dedicados à reconstrução das suas vidas depois de uma tragédia. A maioria da população brasileira também não entende bem qual seria a missão de Derrite. 

O estagiário trabalha em casa, no sistema remoto, e tem tempo para vasculhar o que se passa no Brasil. Ele está sabendo que Derrite foi chamado a Brasília para reassumir sua cadeira de deputado e dar sequência ao marketing da matança no Rio. A extrema direita é que entende de caçada a bandidos. E Derrite, como policial da PM de São Paulo, seria um grande caçador.

O estagiário sabe que direita e extrema direita chamaram Derrite porque: 1. Ele é o cara da porrada da Rota. 2. É homem de Tarcísio, que se acha ainda no jogo. 3. Ele é candidato ao Senado e pode ser o nome de Tarcísio ao governo de São Paulo, se o extremista moderado decidir enfrentar Lula.

Mas o que o estagiário mais sabe é que Derrite voltou ao Congresso para afastar a Polícia Federal, se possível, dos cenários de todos os crimes organizados, do tráfico e das milícias às gangues das emendas.

Derrite quer tirar a PF não só de perto dos homens do PCC, mas principalmente dos políticos do bolsonarismo, dos executivos da Faria Lima e dos acumpliciados de outras áreas com os chefões que ele diz combater. 

Derrite tentou blindar, com suas versões do projeto antifacções, todos os que trabalham com e para o crime organizado dentro de estruturas de poder político e econômico, em governos estaduais, prefeituras, fintechs.

O estagiário sabe que ainda esse ano e principalmente em 2026 a PF vai fechar o cerco em torno da extrema direita associada ao crime organizado. Mas os moradores de Lajeado, no centro da região da tragédia da enchente do ano passado, talvez não saibam direito.

A grande maioria da população brasileira também não sabe, porque é preciso tocar a vida. Não sabe que foi a Polícia Federal que puxou o fio capaz de levar à localização de R$ 120 milhões destinados pelo governo federal ao socorro dos desabrigados da região de Lajeado. A PF tem indícios do desvio do dinheiro.

A Polícia Federal, que Derrite pretendia afastar de investigações envolvendo crime organizado e os políticos, pegou o secretário de Desenvolvimento Urbano e Metropolitano de Eduardo Leite, Marcelo Caumo. 

Caumo era prefeito de Lajeado quando os R$ 120 milhões teriam sido desviados em manobras fraudulentas. A Operação Lamaçal investiga suspeitos de mais nove municípios. É um começo, porque a tragédia que matou 185 pessoas atingiu mais de um terço do Estado. A PF vai pegar mais gente.

Mas o brasileiro médio, essa figura que acorda às 5h, pega metrô e dois ônibus para chegar ao trabalho, que não tem tempo para saber o que Derrite anda fazendo, esse brasileiro não sabe que o secretário de Segurança de Tarcísio foi chamado para fazer o serviço sujo na Câmara.

E o serviço, como relator do PL antifacções, começava pelo amordaçamento da Polícia Federal, que investiga as relações da Polícia Civil de Tarcísio e Derrite com o crime organizado, a partir da morte do delator do PCC Vinicius Gritzbach, há um ano no aeroporto de Guarulhos.

Pelo parecer de Derrite, a PF não deveria se meter em investigações sobre crime organizado. O deputado queria só as policiais locais, sob o mando dos governadores, ‘caçando’ bandidos grandes. As mesmas polícias que também estão na mira da PF como corruptas.

O estagiário do PCC na fintech da Faria Lima sabe o que Derrite pretendia. E percebe agora que a extrema direita vai perder mais uma, como vem perdendo desde aquele dia em que o chefe de Derrite disse que bebe muita Coca-Cola.

O que se lamenta é que os moradores de Lajeado e o brasileiro médio talvez não saibam o que estagiário está sabendo. E esse é o problema do governo, das esquerdas, dos democratas e de todos os antifascistas.

O brasileiro talvez não tenha se dado conta de que o plano de Derrite era blindar os parceiros. Se não houvesse essa irmandade dos políticos com os PCCs, talvez a preocupação não fosse tão grande.

Derrite estava tentando blindar os que lavam dinheiro do crime organizado. É gente que ele, como policial e homem da segurança, conhece bem. Tarcísio conhece. O fascismo de São Paulo conhece há muito tempo.

A estratégia falhou, como vem falhando tudo que eles têm tentado esse ano, com exceção da matança no Rio, considerada um sucesso. Eles terão que preparar novas eurekas mais adiante. Mas, como são imprevisíveis, não há nem como se preparar.

Líderes e mandaletes da extrema direita desorganizada tentam se reacomodar no cenário nacional em cima dos cadáveres do Rio e protegendo os seus que ganham dinheiro em sociedade com as facções. Mas a Polícia Federal vai pegá-los.





 

Do sertanojo ao nojo por Lô Borges e pelo Clube da Esquina, por Manoel Herzog



Quando eu costumava ser um operário na indústria, e depois, na advocacia trabalhista, sempre me absurdou a expressão "licença-nojo", aquele direito que o trabalhador tem, uns dias de liberdade do cativeiro liberal por conta do falecimento de um ente querido. Quando casa, tem direito a uma tal "licença-gala", termo que não deixa de ser interessante. As raízes ancestrais do termo "nojo", agregado ao conceito de luto e tão distante do sentido original, de repulsa, vêm do latim, pai do português arcaico e avô do moderno. O termo latino "nauseam", que derivou para nojo, significa pesar da alma, dor profunda moral, sensação insuportável. No arcaico equivalia à dor pela perda, no moderno ficou mais restrito à aversão por algo repugnante. Jean Paul Sartre deu à sua maior obra o título "A Náusea", falando do sentimento vigente na humanidade no século que consolidou o liberalismo econômico ao lado do conservadorismo moral. Faço este preâmbulo para dizer que estou absolutamente enojado da morte de Lô Borges. Eu e toda uma geração não superamos um luto recente, seguimos a sofrer, a inconformar, a não aceitar, por mais que os good vibes insistam em desejar ao espirito do finado uma senda de luz na eternidade etc

                    A morte do Clube da Esquina

A morte do Lô, junto à lenta e dolorosa agonia do Milton, representa a morte do Clube da Esquina, e a morte do Clube da Esquina nos enoja a todos, porque metaforiza a morte da música brasileira, talvez, neste país de tão retumbantes fracassos, nossa maior conquista civilizatória. Nossa economia é suja, formada sobre um leito de opressão e exploração, nosso direito é canalha, nossa política é podre, mas tínhamos a música, que hoje estertora em praça pública sob um mar de soja transgênica.

Com sua lucidez habitual, Zeca Baleiro, levado a BH por razões lutuosas distintas, aproveitou e foi prestar sua homenagem no velório do Lô. Proferiu uma sentença triste, mas verdadeira: não surgirão mais compositores feito o, ele pertence a uma era perdida. Talvez que o próprio Zeca seja o último titã (não a bandinha), não duvido, e não que nos faltem talentos, estes abundam, os talentos é que não têm mais vez.

                   Os verdadeiros mamadores

Bradam contra a Lei Rouanet os direitistas (seja lá o que for isso), mas os maiores mamadores de verba pública para apresentação de espetáculos musicais tétricos são uma lista que vai de Bruno and Mahoney até Gustavo Lima, passando por Zezé e afins. No dia que Lô Borges morreu eu me sentei num banco de shopping, aqui em Santos, e pus-me a ouvir a conversa de um senhor (devia ser dono da loja em frente) pra duas funcionárias, elencando suas preferências musicais. Ouvi de passagem os nomes do mesmo Lima, de Marilia Mendonça, de Chitãozinho. Cheguei a desejar-lhe as piores coisas, mas não quero julgar aquele senhor, ele tem até uma loja, é um vencedor, não quero julgar as vendedoras que ouvem esse monte de merda, foi o que se lhes deu a ouvir. Eu mesmo cresci ouvindo bossa nova e Silvio Caldas, contrariado, odiava, meu avô me obrigava a ouvir por osmose, não desligava a vitrola. Formei-me assim, sou este ranzinza. Aguardemos a ver no que resultará a formação cultural dessa geração que ouve agronejo. Não estarei pra ver, com a graça de Deus, em cujos braços pretendo estar quando se der a Revelação.

                            O paradoxo

O Clube da Esquina, paradoxalmente ao fato de ser o maior movimento contemporâneo da música nacional, foi justo o turning point que sepultou o samba e abriu caminho ao nefasto rock nacional e ao sertanejo, tudo sob o elegante nome "folk"., o beatle-barroco, congrega a tradição brasileira das Geraes e aponta pra um futuro cosmopolita. O processo civilizatório desses mais de 500 anos de nação segue um fluxo natural, do litoral ao interior profundo. Nossa literatura nasce carioca e portuária, vai numa trilha (a Estrada Real?) de Machado de Assis país adentro até encontrar Rosa. Da mesma forma a música, que atinge, depois de Villa Lobos e Pixinguinha, um ápice com Antônio Carlos Jobim e que, através do grande Maestro carioca, ruma Brasil adentro pra encontrar o Clube. Nós perdemos o trem azul da história, contudo.

Penso que o encontro da wave universal com o Brasil profundo merecesse digestão mais lenta, feito a da velha sucuri dos confins selváticos. O atropelamento, a violência do processo, que começa tão lindo (vide Rosa, vide Clube da Esquina) devia se consolidar melhor, maturar, é da natureza da cultura cultivar, dar um tempo, curtir. Não, avançaram feito uns desgraçados pro interior profundo, sem formar uma tradição, o que resultou, em literatura, na infantilidade da poesia contemporânea herdeira de Manoel de Barros (que venham as pedras), e, na música, no rock nacional do cerrado e no sertanejo de soja que empesteia os palcos das prefeituras brasileiras. (que venham mais pedras).

 Brasil está enojado da morte do Clube da Esquina, é insuportável. Sem ter merecido a reverência devida, atropelado pelo processo econômico tão eficiente em produzir arte de má qualidade. Não conseguiremos nos conformar tão cedo, que Deus conforte o nosso coração.



 

JOSÉ CARLOS OLIVEIRA OU AHMED MOHAMAD OLIVEIRA

Para CGU e PF, ex-ministro de Bolsonaro foi pilar de esquema no INSS…

 

Está escrito na decisão do ministro André Mendonça, do Supremo, em tons menos graves e mais genéricos, mas para investigadores da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União, órgão que identificou e denunciou as fraudes no INSS, o ex-ministro de Jair Bolsonaro , José Carlos Oliveira (hoje atendendo pela alcunha de Ahmed Mohamad Oliveira),  foi peça fundamental para dar lastro, ampliar e refinar o desvio de dinheiro de aposentados.

Um integrante da CGU ouvido pela coluna trata a coisa de maneira direta. Para ele, Oliveira é o arquiteto do esquema que alcança mais de uma dezena de entidades

Valendo-se da fragilização das regras de fiscalização da autarquia, durante o governo Bolsonaro, ele teria, segundo apurou a coluna, refinado o esquema que permitiu a fraude de milhões de assinaturas de aposentados, filiando-os ilegalmente para, assim, descontar pequenos valores direto das folhas de pagamento todos os meses

A derrubada da exigência de checagem periódica da adesão de aposentados e pensionistas do INSS ocorreu no governo Bolsonaro, sob a anuência da chefia de turno do INSS e do Ministério da Previdência. O então presidente foi orientado a não vetar o dispositivo que escancarou as portas do esquema.

Só a Conafer, uma das instituições sob investigação, teria roubado mais de R$ 600 milhões dessa forma —e abastecido uma lista de recebedores de propina nos dois últimos governos e também na Câmara dos Deputados e em legislativos estaduais…

O ministro relator do caso, André Mendonça, registrou em decisão que, para a PF, "José Carlos Oliveira foi um dos pilares institucionais que permitiram o funcionamento da fraude da Conafer. [Primeiro] Como Diretor de Benefícios e, depois, ministro, autorizou repasses ilegais e recebeu vantagens indevidas

Oliveira era do quadro do INSS, chegou à presidência do órgão no governo Bolsonaro e, depois, quando Onyx Lorenzoni decide deixar a pasta do Trabalho e Previdência, herdou o ministério.

"Várias das mensagens interceptadas pela PF geram fortes indícios de que o esquema criminoso envolvendo o investigado José Carlos Oliveira estava em pleno funcionamento também no período em que ele era ministro de Estado do Trabalho e Previdência Social do Brasil", escreveu Mendonça na decisão…

"Como exemplo, podemos citar as mensagens de WhatsApp contidas nas folhas 231-232 [do relatório da PF]. A planilha de folha 233, há, também, indícios de que valores obtidos ilicitamente foram repassados ao investigado em data que ele era ministro de Estado

Segundo o processo, Oliveira chegou a agradecer o pagamento de propina em mensagem pelo aplicativo.

O ministro do Supremo registra ainda que "quando era Diretor de Benefícios do INSS, em 1º de julho de 2021, José Carlos Oliveira, autorizou o desbloqueio e repasse de R$ 15,3 milhoes à Conafer, mesmo sem a comprovação das filiações exigidas"…

"Essa liberação foi feita em desacordo com o regulamento interno e sem exigir documentos comprobatórios, o que possibilitou que a Conafer retomasse e ampliasse a fraude de descontos em massa, através da inserção indevida de 30 listas fraudulentas, que incluíram descontos em mais de 650 mil benefícios [de aposentados e beneficiários do INSS]".

A decisão detalha ainda que a investigação considera Oliveira como peça "estratégica", com atuação "decisiva para o funcionamento e blindagem da fraude da Conafer"…