Os burocratas e o pelotão - Afif Jorge Simões Neto
Homenageando o autor meu amigo, confrade e quase colega Afif Jorge Simões Neto - Juiz de Direito em Santa Maria - RS.
Continua o combate aos "burocratas" que atravancam o cotidiano.
No seu livro O amor acaba, o cronista mineiro Paulo Mendes Campos não deixou por menos: o câncer mata mais ou menos depressa; a burocracia, mais impiedosa, não tem pressa. De quanto mais tempo dispuser para comer teu tempo e teu gosto de viver, melhor para ela. É a coisa mais chata do mundo moderno.
Pois animado pela possibilidade de regenerar um que outro burocrata empedernido, tomei de mim e dos meus filhos um tempo sem retorno e fui atrás das explicações científicas. Após uma sucessão de entrevistas com o pessoal ligado à tenebrosa área de atravancagem da vida alheia e à coleta de prova documental, capaz de entupir os graneleiros da cooperativa, atestei: não tem solução.
- Eta, racinha bandida!
O que me impressionou de verdade neste trabalho de campo é que nenhum burocrata se assume como tal. Todos se têm como muito preocupados em bem atender a massa societária que o vulgo chama de contribuinte. Ninguém figura como culpado pela burocracia, e ainda não nasceu quem possa se achar responsável por ela. Típica filha bastarda, a procura de um pai que lhe empreste o sobrenome.
A mulher doente que veio lá da Vila do Cachorro Sentado, em busca apenas de um benefício frugal a que tem direito por tempo de serviço, com um filho em cada braço, e mais uma chusma galga por boia que ficou em casa, vai ter que voltar na semana que vem, sentencia o funcionário. Barnabé treinado à exaustão para a terrível arte de negar, como disse o sábio J. Bicca Larré em uma de suas crônicas dominicais no Diário de Santa Maria. Enquanto fala, um filete de baba começa a escorrer pelos cantos da boca. É o gozo oral advindo da maldade. A satisfação do embaraço, de se mostrar graúdo ao miserável que só precisa de um simples naco de papiro floreado para seguir tocando a vida.
Uma Amazônia de árvores necessita ir pro chão regularmente para aplacar a fome da burocracia, que se alimenta do excesso de decretos, portarias e formulários. Quanto maior for a tranqueira legal que o burocrata possa causar à rotina das pessoas, mais brilhoso ficará seu olhar por detrás do balcão da repartição pública.
Burocrata que se preze, os de carteirinha, não resolve coisa alguma. O negócio dele é pedregulhar o caminho das pessoas, com frases do tipo “lamento muito, mas o seu prazo venceu ontem”. Mentira! Lamenta umas pivicas. Ele se lambe de prazer quando consegue transformar a solução em espinheira. Tem verdadeira idolatria por carimbos e almofadinhas e passa o tempo matutando uma fórmula ainda mais nazista de ferrar quem se vê obrigado a lhe pedir bênção.
Antonio Silveira Pires (ex-secretário do governador Ildo Meneguetti), no livro “Aspecto Contagioso da Mediocridade”, relata a alegria de um burocrata impondo mais sofrimentos a um velho aposentado, que tivera os pagamentos suspensos até que apresentasse diversos documentos. Dentre tantos papéis, deveria mostrar atestado de que estava vivo, de modo a evitar que herdeiros continuassem, via procuração, recebendo em lugar do falecido. O pobre velho, depois de longa peregrinação, entregou alegre, por incrível que pareça, o papelório solicitado. O burocrata, do alto de sua impenitência, ao examinar o “atestado de vida” relativo ao ano então em curso, não se deu por vencido:
– Falta o atestado de vida do ano anterior!
São ou não são uns vermes com CPF?
Agora que o companheiro Fidel entregou de vez a rapadura, bem que ele podia nos ceder por uma quinzena bem chorada o seu tão prestimoso paredão. É claro que não seria para testar ninguém do Big Brother e muito menos para executar ativistas da oposição federal, até porque hoje ela tem tanta utilidade em nosso país quanto buzina em avião. O empréstimo teria outra finalidade, bem mais proveitosa: dizimar alguns burocratas à guisa de exemplo. No embalo do estanho, também iriam para a banha quente os juízes que se vendem e os políticos corruptos, embora acredite que vá faltar bala quanto aos últimos!
O fuzilamento aconteceria, já imagino, numa sexta-feira neblinada e após o expediente. Em vez do bar, a praça pública. No lugar do chope com colarinho duplo o cheiro de pólvora entrando pelo nasal. Os demais burocratas – aqueles com menor potencial ofensivo, e que seriam poupados da eliminação física, por enquanto – receberiam uma convocação extraordinária para presenciar, em obsequioso silêncio, a cena educativa. Ah, e sem o direito a exclamações de espanto na hora em que o pelotão estiver a postos para empeçar tão sublime ato de extermínio.
Se vai causar algum efeito o método pedagógico da execução sumária, não tenho como prever de antemão. Mas uma coisa é certa: os que sobrarem irão pensar duas vezes antes de mandar voltar na próxima semana quem apenas veio em busca de um papel floreado para seguir tocando a vida...
Saudações Ovelheiras!
Ivan Saul D.V.M. M.Sc.Vet. – Granja Po’A Porã, 16/nov/2013.
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